Hoje o RdC recebeu esse o seguinte e-mail:
Bom dia RdC!
Estou enviando um texto que uma das jogadoras de meu time, o Raça Rugby Ribeirão feminino, escreveu. Ela tinha se proposto a escrever apenas sobre a 3a etapa do Circuito Paulista de Sevens que participamos, mas por fim escreveu um texto sobre a jornada de nosso time até aqui. O texto é um pouco extenso, fique livre para usá-lo como puder.
Obrigada!
Amanda Duarte
Raça Rugby Ribeirão feminino
Amanda, nós é que agradecemos pela bela história e estamos publicando por completo!
A todos que se apaixonaram uma vez na vida!
Nunca vi um nome que descrevesse tão bem algo, ou alguma coisa, como o nome desse time: RAÇA! Tem que ter muita raça mesmo para conseguir participar de um campeonato paulista de rugby sem patrocínio nenhum, sem apoio de prefeitura ou qualquer outra forma de suporte financeiro.
Esse time que só existe há seis meses, o feminino, já que o masculino existe desde 1992, já teve diversas formações. Algumas jogadoras entraram, outras saíram e algumas tentam conciliar sua vida corrida com os treinos e jogos. Afinal, ninguém vive do rugby nessa cidade e são poucos que vivem dele no país.
Infelizmente, se o esporte não tem uma bola redonda, não tem tanta visibilidade e por esse motivo, entre outros também, tem sido praticamente impossível consegui patrocínio.
Temos apoio de uma academia, nos auxiliando no preparo físico, um campo cedido por uma universidade, para treinos e um site em construção, cedido por uma empresa de informática, mas, como pouca notoriedade significa pouca rentabilidade, por enquanto ainda temos que arcar com nossas próprias despesas.
O time feminino, o qual irei me referir em todo o texto quando digo nós, tem angariado mais que verba, mais integrantes para a família Raça. Sem condições de viajar para um torneio em Lorena, promovemos um amistoso contra o time feminino de São Carlos, mas devido a problemas semelhantes aos nossos, somente duas jogadoras puderam vir para Ribeirão Preto, jogar com a gente, a Chris Vianna e Karla Nóbrega.
Fazendo um “catadão”, como as garotas mesmo disseram, mesclando o time de São Carlos com o de Ribeirão Preto. Foi aí que construímos novos laços de amizade e pudemos ter o nosso primeiro terceiro tempo, com todas as músicas e brincadeiras que tínhamos direito. Nossos colegas do time masculino também estavam lá, fazendo a arbitragem do jogo e nos ajudando.
Depois houve o campeonato de um dia de Jaguariúna. Com apenas três times femininos inscritos, interagimos com os outros times, ganhamos medalha e a canseira que quatro jogos em um dia pode nos oferecer. E nesse dia, ganhamos mais uma integrante na família, a Kika, que joga no Jequitibá de Campinas. Pronta pra jogar com um time que nunca havia treinado e se encontrar com jogadoras que nunca tinha visto pessoalmente.
A história do time gira muito em torno do orkut, site de relacionamento onde as primeiras jogadoras se encontraram procurando mais sobre o esporte e acabaram indo assistir a um treino e foram fisgadas pelo rugby. Os contatos entre o time de São Carlos e a Kika de Campinas, foram todos através do orkut.
Jogamos em Jaguariúna, na raça que sabemos jogar. Sem um time completo, ainda contamos com ex-jogadora do time, que havia ido só para assistir, mas que na hora da necessidade, entrou em campo de allstar e pôde ainda assim, nos ajudar. Essa é a Marcela Iossi.
Tão cansada estávamos, que nem participamos do terceiro tempo, e tão logo pegamos a estrada de volta pra casa. Cansadas, porém felizes, por ter conhecido um pouco mais do espírito do rugby, espírito esportivo esse que eu nunca havia encontrado, em nenhum outro esporte.
Quando surgiu a oportunidade de nos inscrevermos para o campeonato paulista de seven, ficamos com muito receio. Não era o pouco tempo de treino que nos preocupava, mas sim a falta de grana e de jogadoras. Nem todas tinham a disponibilidade desses dois dias de jogos. Desfalcadas, com duas jogadoras em viagem, sendo elas a capitã e a segunda capitã, elegemos a terceira capitã, que se mostrou digna do posto que lhe foi confiado.
Então surgiu a idéia de vender uma rifa, de um vôo panorâmico pela cidade. Todas corremos atrás de vender e assim conseguir levantar o dinheiro necessário, para pagar as inscrições, filiações na federação paulista, inclusive das novas integrantes da família, e ainda pagar a van que nos levou até Indaiatuba, para a primeira etapa do campeonato. Foram dois dias de jogos, onde conhecemos mais jogadores e jogadoras de rugby e apaixonados pelo esporte.
É um show a parte ver a união de cada time, a sua sintonia em campo e a garra. Mesmo sem poder ainda ter uniforme, nós tínhamos uma camisa, que havíamos bordado o brasão do Raça, quando São Carlos foi jogar com a gente no amistoso, e esse tinha sido o nosso uniforme, até então.
Desconfortável para aquelas que não tem o tamanho PP, mas jogamos assim mesmo. Tivemos bom progresso em campo, fomos elogiadas por antes adversárias declaradas. Aprendi que nesse esporte, a disputa só existe dentro de campo. Fora dele, todos compartilham de uma mesma paixão. E é uma paixão mesmo. Algumas deixaram de jogar futebol e handball para se dedicar inteiramente ao rugby.
Mas nessa etapa, tudo que não aconteceu em Jaguariúna, aconteceu. Tais e Paula, que haviam se machucado em treinos, tiveram uma piora e a Tais teve que fazer uma cirurgia. Eu quebrei a perna no segundo dia de jogo. A Thauana
Nesse mesmo jogo, a nossa integrante interina, a Karla, torceu feio o pé, e teve que sair na ambulância, no meio da partida. Isso tudo e mais outras escoriações que outras sofreram. Quem entra no rugby sabe dos riscos que corre, mas ninguém quer ficar fora do jogo. Isso que mais nos dói.
Enquanto nos recuperávamos, os treinos continuaram, e novas garotas entraram, com sangue novo e vontade de entrar em campo. Deixamos de ir à segunda etapa, que foi em Vinhedo, para poupar quem estava em recuperação e por falta de grana, mais uma vez. Nesse meio tempo, continuamos correndo atrás de patrocínio e meios de conseguir dinheiro para participar da terceira etapa. Eis que vieram as pizzas.
Vendemos pizzas para pagar as despesas dessa nova viagem. Próxima da data do jogo, ainda não tínhamos arrecadado o dinheiro necessário, e o que fizemos? Vendemos adesivos de apoio ao rugby! Saímos pela noite de Ribeirão e vendemos em sinais de trânsito e barzinhos. Completamos com um pouco de nossa grana, mas tínhamos conseguido enfim, ir para Lorena!
Viajamos com a mesma van, e mais uma vez passamos em São Carlos para pegar nossas jogadoras, dessa vez com uma a mais, a Camila Modenese. Chegamos bem cedo na cidade, e ficamos esperando até o momento de entrar em campo. O tempo todo eu coloco “nós” porque, por mais que eu só possa voltar a jogar daqui a oito meses, eu ainda faço parte do time. Eu vendi pizzas, eu estava lá na venda dos adesivos e vendi também. Eu sou do Raça, não importando se entrei ou não em campo.
E digo o mesmo das jogadoras que não puderam ir. Quando você entra para uma família, você não sai dela, nunca mais. Conhecemos novos amigos, como o Diego, opa, Lucas, o Leonardo e todos que dividiram a sombra da árvore com a gente, que nos abrigou de um sol quente.
Todos usamos a mesma água da mangueira para nos refrescar. Todos tomamos o mesmo café da manhã, dividimos o almoço e o jantar. Compartilhamos a cerveja e a juru pinga no terceiro tempo.
Aprendemos novas músicas, e umas muito com o Didi, dos Tornados de Indaiatuba, que puxou o brinde e algumas das brincadeiras.
O terceiro tempo é tão importante para o rugby quanto a bola para o esporte. Através dele acabei com a raiva que tinha de um time, através da simpatia de uma de suas jogadoras. No dia seguinte, o clima é mais leve, brincamos mais, conhecemos melhor aquelas pessoas que estão lá, antes aparentemente tensas, mas agora, sorrindo.
Ribeirão geralmente causa aonde vai, e claro que estou falando do time feminino. Mechemos com os outros times, damos apelidos, recebemos apelidos de volta. Mas tudo vale a pena. Ganhamos elogios, como por jogar limpo, de jogar com raça e que temos melhorado a cada jogo.
Dessa vez, jogamos com o uniforme emprestado do nosso time masculino, e como mudou nossa cara. Melhor do que nós que escolhemos jogar nesse time, é ter quatro meninas que também nos escolheram, mesmo tendo seus próprios times, em sua cidade. A elas agradecemos e a todos que tem nos acompanhado e ajudado. Agradecemos ao nosso técnico, o João Chaves, carinhosamente conhecido como Teta, e aos meninos do masculino que sempre nos deram suporte e treinamento.
Não podemos deixar de agradecer também as empresas que nos apóiam como a academia WP Sport Fitness, pelo preparo físico, à faculdade Moura Lacerda por ceder seu campo aos treinos e à Dotplex pela hospedagem do nosso novo site, o www.rrrfeminino.com.br, que ainda está em construção.
Muito obrigada a quem tem acreditado em nós, que ainda temos pouca experiência, mas ainda daremos muitas alegrias representando a cidade. Ainda não temos títulos, mas o time está em constante crescimento, e logo teremos conquistas para comemorar. Hoje em dia, a gente comemora por existir um time de rugby feminino em Ribeirão Preto. Só aí, temos uma primeira vitória.
O rugby entrou para as olimpíadas, e se você não conhece ainda vai se apaixonar por ele, e entender o porquê de tanto sacrifício, só para jogar.
Alexia Bassi